segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O Sermão das migalhas.

Por - rosana.jatoba |categoria Sem categoria
Site G1 - http://g1.globo.com/platb/rosanajatoba/



A esta altura você já sabe onde vai degustar as delícias do jantar ou almoço de Natal. E mesmo se estiver longe da familia, vai se dar ao luxo de escolher uma ceia num restaurante ou de dar um pulo no supermercado para comprar os tradicionais peru, tender, farofa e as frutas cristalizadas. Vendo a mesa farta, ladeada pela árvore ricamente decorada, as velas acesas a perfumar a casa, e os presentes à espera dos sorrisos de satisfação..terá a impressão de que em todos os lares cristãos do planeta, há alimento de sobra para o corpo e o espírito.

É que a tal magia do Natal nos anestesia para a dura realidade dos grotões, onde a solidariedade é sazonal e a estupidez reduz o ser humano a objeto.


O número de famintos no planeta está em torno de 1 bilhão, de acordo com a Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento e a Agricultura (FAO). Isso significa que um em cada seis seres humanos passa fome. Soco no estômago! É gente que, em sua maioria, habita a África, Ásia e a América Latina, já que no hemisfério de cima, o drama é o oposto. De um lado, mesas abarrotadas e pessoas superalimentadas; de outro, multidões famintas a se baterem por escassas migalhas.
A própria FAO atribuiu o acentuado aumento no número de famélicos a uma combinação da crise financeira internacional e da persistente elevação dos preços dos alimentos. Situações em que nós, pobres mortais de barriga cheia, figuramos como meros telespectadores.
É como bem assevera o cardeal arcebispo de São Paulo, Dom Odilo P. Scherer:
“ A solução para o problema da fome está menos na roça e nas mãos calejadas dos agricultores do que nos gabinetes e fóruns das decisões políticas, econômicas, financeiras e comerciais. A fome será superada mais pela ponta da caneta do que pelo cabo da enxada”.


Porém, um terceiro fator nos chama à responsablidade imediata: o desperdício nosso de cada dia.
Dados deste mesmo relatório da FAO revelam que um terço dos alimentos produzidos no mundo, cerca de 1,3 bilhão de toneladas anuais, se perde ou é desperdiçado. No Brasil, este índice chega a 40%, algo em torno de 39 milhões de quilos diários de comida.
Os consumidores ricos jogam fora 222 milhões de toneladas de frutas e hortaliças, volume equivalente à produção de alimentos na África. Cada um de nós manda para o lixo 115 quilos de comida por ano.

O descaso começa lá no campo, com o acondicionamento inadequado; segue no transporte, quando chegam nas feiras e mercados; e, por fim, continua em nossa geladeira. Quantas vezes não compramos além do que iríamos consumir?

Pensar em toda a cadeia produtiva do alimento, desde os adubos utilizados, o suor do trabalhador rural até o combustível gasto do campo à mesa, ajuda a despertar a consciência? E refletir sobre as montanhas de lixo que geramos com os restos?

Diante das perspectivas de que os preços dos alimentos continuarão a subir e a produção precisará crescer 70% até 2050 para alimentar os 9,2 bilhoes de pessoas que estarão no mundo nesta época, teremos que quebrar o paradigma comum no Brasil, com relação à cultura do excesso, da abundância, do “é melhor sobrar do que faltar”.
A esta altura estamos tão atarantados com a correria de fim de ano, os balanços das finanças, a ansiedade pelas férias, os projetos para 2012, que é mais do que merecido o banquete natalino.
Em atenção à data peculiar, provemos também do alimento da alma: “Eu sou o pão da vida; o que vem a mim jamais terá fome ”

Mas quando a farra gastronômica passar, fiquemos com o exemplo de um outro ser iluminado, a quem reverencio. De acordo com os ensinamentos de Buda, “ A quantidade de alimentos necessária para cada ser humano é aquela que cabe na concavidade de suas mãos unidas”.

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