terça-feira, 11 de novembro de 2014

Complexidade da Judicialização da Saúde Pública

Por Edu Marcondes

Nos últimos anos é notória a reclamação generalizada da opinião pública em relação a saúde. Que a saúde está um caos é o apelo mais comum. Mas o que de fato está acontecendo, e por que temos visto um onda, para não dizer um tsunami de decisões judiciais sobre as administrações municipais de saúde? É preciso uma imediata reflexão sobre o assunto. A situação está aí; bem nítida aos olhos de quem quiser ver. Tanto é assim que o uso eleitoreiro desse tema é muito comum, em todos os rincões do país.




Para começar é preciso dizer que a decisão judicial para um caso médico é ocasionada devido a incapacidade do sistema público resolver o problema. Que o SUS não consegue atender a demanda de maior complexidade, tais como cirurgias ortopédicas, oftálmicas e gastrointestinais, ninguém em sã consciência pode negar. Fruto provavelmente e na maioria das vezes de uma demanda muito maior do que a capacidade da rede em absorver. Esses procedimentos de alta complexidade são muito caros e carecem de uma estrutura hospitalar muito bem implantada, além de diversos exames complementares, não menos complexos. Os municípios raramente conseguem montar uma estrutura necessária ao atendimento desses casos.

O SUS, tratou de criar uma estrutura em rede que pudesse “integrar” os municípios, de forma que os de maior capacidade técnica pudessem absorver a atender os pequenos municípios que passam longe de poder ter uma estrutura compatível. A lógica que os municípios maiores pudessem ceder um pouco de suas vagas para atender os pequenos, contando que esse teriam uma pequena demanda. Na prática esses pequenos em conjunto formaram um gigante que sufoca os municípios médios, que ao invés de ajudar, passaram a não dar mais conta de atender suas próprias demandas. Com as faltas de leitos os médios buscam as capital e seus “grande” hospitais para re-encaminhar os pacientes que superlotaram sua estrutura. As capitais por sua vez se tornaram mais superlotadas ainda pois agora absorvem os excessos e demandas não atendidas de todas as regiões dos estados. Resultado, filas sem fim no sistema, e baixíssima resolução de casos.

O que já é muito ruim se torna pior ainda, quando se cria a consciência coletiva que vemos hoje. Posições politiqueiras se aproveitam do sofrimento dessas famílias que transitam sem rumo e sem solução no sistema, atacam os gestores, jogando a população contra o SUS. Pronto.... todo mundo diz que o sistema é uma porcaria, que isso, que aquilo, etc. Solução que é bom, pouca gente se esforça em dar. Como consequência as pessoas passaram a procurar os órgãos de justiça a fim de encontrar a sua solução. O intento é que como num passe de mágica sua cirurgia seja marcada de imediato. Porém na prática isso não se conclui, e pior gera outro problema mais complexo, e talvez mais grave; a necessidade de se tomar providencias administrativa sem os devidos cuidados e abordagens legais. É o famoso, se ficar o bicho pega, se correr o bicho come.

Para que o gestor cumpra a decisão judicial, ele deve comprar no ambiente particular o procedimento que o cidade está demandando. Para isso a lei obriga que seja aberto um processo administrativo de compra, a famosa LICITAÇÃO. Por força da determinação do juiz é possível realizar a compra por dispensa de licitação, contudo isso deve aparado por alguns procedimentos formais. A presença de pelo menos três cotações no processo é obrigatória, e ai começam novamente os problemas. Forma-se nova fila, agora não pelo sistema de regulação, mas sim no setor de compras.

Qualquer produto, ou insumo, é de fácil cotação; basta fazer contatos com fornecedores e obter as cotações. Para um procedimento médico não; é preciso que esses orçamentos sejam feitos por médicos especialistas naquela determinada área. Ai pronto, quero ver que é capaz de demonstrar, mesmo na rede particular um médico especialista que faça uma avaliação de graça. E mais que marque consulta imediata. O país tem uma demanda gigante na área da saúde em que médico especialistas são artigo de luxo. E isso por si só já começa a travar a agilidade no cumprimento da decisão judicial. E antes que alguém pense, que o gestor poderia simplesmente pegar a demanda e mandar o paciente pro hospital, deve logo lembra que os juízes determinam o atendimento do caso, mas sem dizer que de forma (essa é responsabilidade administrativa e não jurídica) e nem tão pouco autorizam ou determinam que esse gestor descumpra as legislações do país.

Certamente se o gestor tomar a decisão ao arroubo da pressão, ira cumprir a decisão judicial, mas certamente estará sujeito a que esse mesmo judiciário lhe aplique punições e sansões por atos contra a administração pública. É portanto e de fato uma realidade das mais complexas o que está sendo desenhado no SUS atual. Como solucionar isso ainda é uma posição tanto obscura. O momento é de buscar atitudes e decisões que em conjunto possam pelo menos agilizar, não o cumprimento da ordem do judiciário em si, mas a solução efetiva do problema do cidadão brasileiro. Colocar pressão e mais pressão sobre as prefeituras, e usar isso para fazer política em épocas de campanha, definitivamente deve ser tratado com repulsa.


É preciso que judiciário e executivo que cuida da gestão do SUS busquem um rumo conjunto. Que os estados e união assumam suas responsabilidades pactuadas, que tratam de distribuir verbas de forma mais equânime e conforme as necessidades reais de cada macro e micro região. Que sejam investidos mais recursos na ampliação das estruturas e equipamentos que possam dotar os municípios fora das capitais de dar cabo as demandas, sem ter que espichar as filas virtuais e reais. Que cheguem recursos suficientes a cada município para que cuide bem de seus pacientes sem ter que jogá-lo numa peregrinação sem fim dentro de ambulâncias de cidade em cidade. Enfim o problema é grande e os caminhos possíveis são poucos, mas o desafio está lançado.

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

O Re-inicio do Blog para Falar de Gestão Pública e Saúde

Por Edu Marcondes

Não me lembro em minha vida profissional de um ano tão exaustivo e de tanta pressão. 2014 por isso passou tão rápido e com tantas ações e atividades que foi impossível levar meu blog adiante. Agora já estamos no penúltimo mês do ano, e portanto próximo do período de férias. Somente agora foi possível pensar novamente em executar uma atividade que me agrada e me faz pensar; escrever. Em momentos de muita agitação, escrever ajuda a organizar as ideias e a pensar melhor. É também verdade que um fator motivante foi o período eleitoral, onde pude ver e ler opiniões das mais distintas, muitas boas e consistentes outras simples bobagens.

A motivação foi analisar que nesse mundo globalizado todo mundo escreve o que quer do jeito que quer. Tratei de colocar meu blog novamente na ativa afim de expor minhas opiniões de forma bem pautada e dentro da ótica que penso ser a mais correta. Minhas impressões claro são sempre fruto da teoria que carrego associada as minhas experiências de vida profissional, buscando sempre se limitar ao caráter mais técnico possível. Medicina Veterinária, Saúde Pública e Gestão Pública devem direcionar essa nova fase do blog.

Para recomeçar nada melhor do que analisar o ano da gestão operacional da saúde pública em Dourados-Ms. Tenho certeza que análise semelhante poderá ser feita em diversos municípios brasileiros. A exato um ano atrás a cidade não tinha filme de RX para atender o pronto atendimento médico – PAM; faltavam gaze, agulhas, equipos, medicamentos entre outros. Contratos com fornecedores para reabastecer os estoques eram irrisórios e todos com aditivos e preços defasados, o que fazia que as entregas não se concretizassem. A frota era completamente sucateada, faltavam completamente ambulâncias; por vezes não havia uma sequer. A coisa estava muito feia e o primeiro objetivo era imediatamente gerar processos licitatórios que possibilitassem a retomadas dos abastecimentos.

Optou-se então por aderir a modalidade de registro de preços, para insumos, medicamentos, expediente, copa e cozinha, materiais de limpeza, alimentação enteral e materiais permanentes, exatamente nessa sequência de prioridades. Para os serviços optou-se em realizar pregões presenciais para manter a lisura e transparências dos processos. Nesse meio tempo ainda havia a necessidade de equipar todo o novo prédio da UPA. Em paralelo havia grande necessidade de reorganizar o contrato de manutenção de frota que chegou a ter mais de 40 viaturas baixadas no pátio.


Outra realidade que obstruía a execução das atividades de forma otimizada, era a completa falta de rumo dos setores do Departamento de Gestão Operacional. Todos os demais setores da SEMS, atuavam com pressão dentro do departamento, no mais exemplar estilo “quem grita mais leva”. As equipes de manutenção, almoxarifado, patrimônio, compras, informática, viviam sem rumo; correndo igual barata tonta e faziam tudo, mas na pratica não faziam nada, ou pelo nunca davam solução definitiva aos problemas. Uma verdadeira gambiarra coletiva.

Ao fazer a avaliação das propostas do ano anterior, junto com todos os setores do DGO hoje, foi possível verificar que todos esses problemas estão equalizados. Não solucionados, mas muito bem encaminhados. Hoje existem contratos novos e atualizados para todos os grupos citados. A UPA está equipada. A frota está no dia de hoje apenas 2 ambulância baixadas e 2 carros no pátio, todos os demais estão em condições de uso, ou em revisões preventivas regulares. Os setores de serviço seguem uma sequência lógica de trabalho sem pressão ou influência direta de outros setores internos e externos. A secretaria, pelo menos desde 2007, nunca chegou ao final de ano com uma situação operacional tão satisfatória. É tudo... Óbvio que não; na mesma avaliação, foi possível certificar que se foi possível avançar em diversos problemas, outros tantos sugiram, e com nível de complexidade muito maiores.

Demandarão para o ano que vem muito mais conhecimento e habilidade de toda equipe operacional. Fica nítido e claro que a cada novo passo de crescimento da secretaria novos e inéditos problemas surgem. Cada novo lote de computadores distribuídos, acrescentam novos pedidos de manutenção, por exemplo. E assim com tudo quanto é novidade da secretaria. O problema disso é que o departamento operacional não está crescendo junto com o restante da SEMS. As equipes não conseguem mais prestar os devidos atendimentos na velocidade e forma desorganizada que a rede solicita. Isso está levando as equipes a exaustão. Aliado a isso a pressão, dos demais setores que não fazem o menor esforço por entender o funcionamento legal de uma estrutura operacional em serviço público acaba por atrapalhar de vez. De forma que está muito claro os limites estruturais e orçamentários a que a saúde de nossa cidade devem obedecer. Ultrapassar esses limites, é criar frustração e embate entre os setores internos, e pior; estar muito próximo de cometer ilegalidades e isso não pode ser permitido em hipótese alguma.


Como solucionar isso? Esse é o grande desafio da saúde pública douradense para 2015. Continuar a avançar e crescer de forma organizada planejada e dentro da lei como se conseguiu até aqui, ou simplesmente ignorar as complexidades das demandas atuais e se arriscar a fazer as coisas de qualquer jeito. Estagnar também não deve ser uma opção. No momento não há formula estabelecida, é preciso que todos juntos busquem o melhor caminho. Sempre em frente... sem perder o rumo!